Opinião do professor Marco Aurélio. Arns, como todos nós sonhamos ser.
Conheci o cardeal Paulo Evaristo Arns em 1981, quando trabalhei como jornalista na Cúria de São Paulo. Era o meu primeiro emprego de verdade. O cardeal abrigava nos corredores do prédio em Higienópolis, perseguidos pela Ditadura Militar Argentina. Além, de índios e lideranças, estes caçados pela Ditadura Militar Brasileira sem trégua. Todas essas pessoas viraram protegidas do Cardeal, homem generoso e forte o suficiente para enfrentar sozinho a violência dos militares, que mesmo vivendo o seu ocaso, continuavam se achando no direito de olhar a sociedade civil brasileira com desprezo, arrogância e totalitarismo.
Dom Paulo era um homem político, descente, pacifico, admirável e com muita liderança. Andava com o pastor protestante Jaime Wright. Ambos incomodavam demais os militares. Denunciavam mortes, torturas e perseguições. E uniam todos aqueles que lutavam por um Brasil mais justo, mais igual e com democracia. Por lá, passavam lideranças políticas, intelectuais, cientistas e o melhor da Igreja Católica.
Lá tive contato com textos, marcados com a palavra Censura da Ditadura Militar, de Lourenço Diaferia. Colunista da Folha na época. E conheci muita gente boa: padres, sindicalistas, lideranças populares, jornalistas, intelectuais etc. Todos, sem exceção sonhavam com a volta da democracia e fim de uma Ditadura Militar que destruiu e mentiu para o país, por mais de 20 anos. Assim, com mente o pseudogoverno de Michel Temer.
Na época, fui encarregado de cobrir a Missa em homenagem a padre Oscar Romero. Morto pela Ditadura Salvadorenha em março de 1980. A Catedral de São Paulo estava lotada. Além de Dom Paulo, estava por lá como um dos oradores, o advogado Luiz Eduardo Greenhalgh. Oscar Romero costumava dizer “a missão da Igreja é identificar-se com os pobres. Assim a Igreja encontra sua salvação. ” Essas palavras poderiam sair tranquilamente da boca de Dom Paulo, que optou pelos pobres, contra a enorme desigualdade brasileira e foi um dos líderes na luta pelo fim da Ditadura Mlilitar Brasileira.
Numa época em que todos nós brasileiros vivemos uma crise econômica, social e politica sem fim. A voz de Dom Paulo Evaristo Arns faz muita falta. Há tempos estamos sem essa voz. Mas, fica o exemplo, de um homem que realizou uma celebração ecumênica na Catedral da Sé, na missa de 7º dia do jornalista Vladimir Herzog, assassinado no DOI-CODI de São Paulo, desafiando uma proibição sem noção da Ditadura.
Missa de 7º dia de Vladimir Herzog, celebrada na catedral da Sé.
Tenho certeza, que se estivesse conosco ainda, o Cardeal Dom Paulo Evaristo Arns, irmão de Zilda Arns, seria contra a PEC 55 e a irresponsável e devastadora ‘Reforma da Previdência’. A primeira, porque além de determinar a miséria como futuro inexorável de um povo, nos revela um conceito monarquista de um governo sem legitimidade e sem aprovação popular (veja a pesquisa Datafolha de domingo passado). E, a segunda, porque tenta trazer de volta a realidade da República Velha; época em que as pessoas trabalhavam até a morte, sem direito a nada, como se a escravidão ainda não tivesse acabado. Por fim, se passasse por Osasco, Dom Paulo – seguramente – seria um defensor ferrenho de novas eleições diretas municipais, diante do desastre que foi a vitória de um candidato, que apesar de ter mandado de prisão com outros 13 vereadores, continua nos EUA a passeio e ainda não se apresentou à justiça brasileira, conforme determinou a Promotoria do Estado de São Paulo.
Marco Aurélio Rodrigues Freitas é jornalista e professor das redes municipal e estadual de São Paulo. Escreve todas as semanas no site Planeta Osasco.