Falta de investimentos leva à perda de empregos na cultura
Os empregos na economia criativa brasileira tiveram queda no primeiro trimestre deste ano, após dois trimestres de tendência de recuperação. Em relação ao mesmo período do ano passado, o setor perdeu cerca de 244 mil postos de trabalho formal e informal, uma queda de 4%. Já em relação ao trimestre anterior – últimos três meses de 2020 –, houve perda de 80 mil postos de trabalho, queda de 1%.
Os números são do Painel de Dados Observatório Itaú Cultural, que revelou que a parcela mais prejudicada no setor de economia criativa foram os trabalhadores especializados da cultura, ou seja, aqueles que atuam em setores criativos exercendo profissões nas áreas de atividades artesanais, artes cênicas e artes visuais, cinema, música, fotografia, rádio e TV e museus e patrimônio. Entre o quarto trimestre de 2020 e o primeiro de 2021, a queda foi de 14%.
Em relação aos primeiros três meses de 2020, este grupo teve perda do emprego de 27%, ou seja, menos 198 mil postos de trabalho. Já o segmento dos trabalhadores criativos especializados não culturais – que incluem ocupações das áreas de publicidade, arquitetura, moda, design, TI, editorial – registrou aumento de 12% nos empregos, com a abertura de quase 234 mil postos de trabalho no período.
O gerente do Observatório Itaú Cultural, Jader Rosa, explicou que essa defasagem na parcela específica dos trabalhadores da cultura foi influenciada pelos impactos da pandemia, especialmente por conta da segunda onda de infecções e mortes de covid-19 no primeiro trimestre, e por falta de auxílios emergenciais para a categoria.
“O principal é essa ausência de investimento e a necessidade que a gente tem desses planos emergenciais e de políticas públicas, justamente para assegurar e promover essa participação e construção tanto artístico-cultural como também do setor em geral da economia criativa, acho que essa é a grande mensagem que a gente quer evidenciar no painel de dados”, disse ele.
Um dos principais motivos para o crescimento do emprego no segmento de trabalhadores criativos especializados não culturais foi o aumento do nível de emprego dos trabalhadores especializados da área de Tecnologia da Informação. Entre o primeiro trimestre de 2020 e o primeiro correspondente de 2021, a taxa de aumento de emprego desses trabalhadores de TI foi de 28%. Já na área de especializados culturais, a principal retração foi observada na categoria de cinema, música, fotografia, rádio e TV, com queda de 43%.
Rosa acrescentou que é importante evidenciar a necessidade dos governos e de setores privados olharem para esses números e, juntos ao setor, se organizarem para uma melhora, crescimento e inovação da economia criativa no país. Para ele, a lei Aldir Blanc não foi suficiente para assegurar a sustentabilidade do setor em temos de crise. Além disso, afirmou que houve poucas iniciativas do setor privado no sentido de garantir a manutenção da economia criativa.
“Tem a questão da falta de fundos emergenciais e de apoio para esses trabalhadores. A gente teve a questão da lei Aldir Blanc, mas não são todas as pessoas que são contempladas pela lei e também não teve outros modelos parecidos com esse sistema. Isso fez as pessoas também terem essas perdas, principalmente no quesito da informalidade o impacto foi grande”, disse ele.
No painel, quanto ao tipo de vínculo de trabalho, foi possível observar que os empregados da economia criativa formais (com carteira assinada, servidores públicos e profissionais empregadores ou por conta própria com cadastro formal de CNPJ) tiveram queda em menor proporção do que os informais (trabalhadores sem carteira assinada e profissionais empregadores ou por conta própria sem cadastro formal de CNPJ).
No primeiro grupo, a queda foi de 2% na comparação entre o primeiro trimestre de 2020 e o primeiro período de 2021; já no segundo grupo a queda foi de 7%. Em relação ao trimestre anterior, os trabalhadores da economia criativa formal mantiveram o nível de emprego, enquanto os informais tiveram queda de 4%. A composição do emprego entre formal e informal segue similar à do total do emprego da economia brasileira: cerca de 60% são formais e 40% informais.
A perda no setor de economia criativa, segundo Rosa, não é apenas para o processo criativo, mas na geração de renda, para terceiros que estão envolvidos com o processo de criação e empresas ou microempresas que também fazem parte da cadeia. “Pensando em uma indústria de cinema, [tem] a questão de figurino, de locação de espaço, de cenografia, cenotécnicos, montagem, é toda uma cadeia que é interdependente, então o impacto é muito grande quando esses setores são afetados.”
No caso dos trabalhadores da música, há impacto em profissionais como holdings, equipe de palco, iluminação, técnico de passagem de som. “A gente tinha outros [apoios e incentivos] acontecendo no Brasil tempos atrás e, justamente quando o Brasil está em crise, foram suspensos todo o modelo de transversalidade e outras oportunidades para viabilizar projetos culturais. O próprio incentivo via lei Rouanet, o repasse foi congelado em boa parte. Isso tudo reverbera e implica nessa projeção e nessa queda”, avaliou.
Além dos trabalhadores criativos especializados – tanto da cultura como fora dela –, compõem os empregos na economia criativa trabalhadores de apoio (trabalhadores não criativos trabalhando nos setores criativos, como contadores e advogados) e trabalhadores incorporados (trabalhadores criativos atuando nos demais setores da economia).
Criada em agosto de 2020, a Lei Aldir Blanc busca apoiar profissionais da área que sofreram com impacto das medidas de distanciamento social por causa do coronavírus. De acordo com dados constantes no relatório parcial de execução da Lei, todos os Estados, o Distrito Federal e 75% dos municípios brasileiros tiveram seus planos de ação aprovados para o recebimento do auxílio emergencial. Segundo o relatório, foi realizado o repasse de R$ 1.499 bilhões aos Estados e ao DF e R$ 1.381 bilhões aos municípios e ao DF. Além disso R$ 118 milhões foram revertidos dos municípios aos seus respectivos estados por não terem solicitado o recurso ou não terem finalizado o processo de solicitação.
Os estados e o Distrito Federal executaram 72% dos recursos disponibilizados. Nas capitais, houve a execução de 83% e, nos municípios que não são capitais foi registrada a execução de 74,5% dos recursos da Lei. Há também 953 municípios que executaram menos de 10% do valor repassado.